VideBula – Episódio 33: Planos de saúde e doenças raras
🎵 Vinheta do VideBula🎵
Pati: Oi, eu sou Patrícia Serrão.
Raíssa: E eu sou Raíssa Saraiva. Bem-vindos a mais um VideBula, seu podcast preferido de saúde, bem-estar e informação sem efeito colateral.
Pati: O acesso à saúde é um direito garantido por lei. Mas quando o assunto são pessoas com deficiência ou doenças raras, esse direito nem sempre é respeitado.
Raíssa: Negativas de cobertura, reajustes abusivos e até recusa de adesão a planos de saúde ainda são uma realidade — e podem ser considerados crime de capacitismo.
Pati: No episódio de hoje, a gente conversa com a advogada e ativista Adriana Monteiro, mãe de dois filhos com deficiência, que explica o que diz a lei e o que fazer quando o plano de saúde nega atendimento a uma pessoa com deficiência ou doença rara.
Raíssa: Também vamos conhecer a história da Letícia Santiago, estudante de medicina, fundadora e presidente da Associação Brasileira das Ligas Acadêmicas de Genética Médica e Doenças Raras (Ablagem-DR). Diagnosticada com Doença de Addison, a Letícia, como várias outras pessoas com doenças raras, também trava uma batalha com o plano de saúde.
Pati: Por fim, falamos com o diretor-adjunto de Fiscalização da Agência Nacional de Saúde Suplementar, ANS, Marcus Braz, que explicou como denunciar possíveis descumprimentos das operadoras de plano de saúde.
🎵 Vinheta de transição🎵
Pati: Adriana, o que a legislação exige dos planos de saúde em relação a pessoas com doenças raras e deficiências?
Adriana: A gente tem várias normativas da da ANS, como eu falei, a gente tem uma legislação, né, obrigando as operadoras a cumprirem tudo que essas pessoas precisam, né?
Eh, é, número de terapia ilimitada para TEA, que foi até suspenso agora por uma nova resolução da ANS e está uma briga no STJ por conta disso, mas são direitos que estão sempre sendo questionados, né? O tempo todo.
As pessoas têm direito ao seu tratamento, né? Da forma como ele é prescrito pelo médico. Agora, o que a gente consegue efetivar disso é outra conversa.
Pati: Existem vários relatos de autistas e pessoas com deficiência e doenças raras que tiveram os planos cortados, né?
Adriana: Desde de 2019, a gente vem passando por uma, por várias tentativas, de se prejudicar, né, as pessoas com deficiência diante dos planos de saúde, né? E aí incluímos pessoas autistas, né?
É, passamos por uma tentativa de transformar o rol da ANS, que é o rol de procedimentos que ela autoriza que os planos de saúde, que ela obriga os planos de saúde a pagar, né? Eh, nós tivemos uma fase que ficou se discutindo se isso seria um rol exemplificativo ou se esse rol ele seria taxativo, né?
Isso foi superado, eh conseguiu-se por meio de decisões judiciais e legislação, que a ANS mantivesse um rol como exemplificativo, mas desde então, eles vêm fazendo outras ameaças, né?
Então, essas negativas, como da pessoa querer fazer um plano de saúde e ter seu plano negado, rompimento de contrato, simplesmente as pessoas são desligadas do plano de saúde sem uma justificativa, né? Encerra o contrato. Reajustes abusivos, né?
Limitação no número de sessões, a recusa de cobertura de medicamentos, né? a negativa de sobre a alegação de que o procedimento não está no rol, né? Tudo isso vem acontecendo e é uma batalha eterna, né?
E cada um desses procedimentos é uma batalha para uma pessoa neurodiversa, uma pessoa com uma doença rara, uma pessoa que já é mais difícil para entrar na justiça e para fazer todo o procedimento que não é rápido também, né?
Raíssa: Como se a gente já não tivesse outras dificuldades para se adaptar, ainda tem essa questão da batalha com os planos. Eu já passei por pelo menos três grandes problemas com o meu plano: já negaram minha medicação, e eu tive que entrar na justiça para conseguir. Tempos depois de ter ganho a ação, o plano rescindiu meu contrato, que era coletivo, e eu tive que entrar com outro processo pra continuar sendo cliente individual, porque eu já tinha a decisão favorável para o meu remédio. E agora, recentemente, descredenciaram uma clínica que eu era atendida há anos e foi o maior perrengue para achar outro lugar pra tomar meu remédio, porque não teve comunicação adequada dessa mudança.
🎵 Vinheta de transição🎵
Pati: Quem também tem uma experiência muito negativa com plano de saúde é a Letícia Santiago. Ela tem 22 anos e convive com a Doença de Addison, que provoca insuficiência renal primária. O estresse é um dos gatilhos que provoca crise da doença dela, que se não tratada a tempo, pode levar a óbito. Um exemplo clássico de pessoa que precisa do plano de saúde funcionando. Mas não foi o que aconteceu, né Letícia?
Letícia: O meu plano de saúde da Amil foi cancelado unilateralmente, ou seja, eles cancelaram sem que eu quisesse, né? E eu entrei em contato com a QualiCorp, que é a empresa pela qual eu fiz o meu plano, porque o meu plano, ele é um plano de adesão da Amil, mas feito com a Qualicorp. E a Doença de Addison é uma doença rara, ou seja, eu posso ter complicações por conta dela. Por conta disso, eu não posso ficar sem o plano de saúde.
E mesmo eu explicando isso para o plano, mesmo eu explicando isso para todo mundo, tendo a carta da minha médica falando sobre os perigos de ficar sem o plano de saúde, ele se recusaram a me devolver o plano. A gente tentou fazer a portabilidade para um outro plano de saúde, mas eu não consegui. E porque nenhum plano me aceitou.
eu entrei em contato novamente com a Amil e eles não aceitaram.
Raíssa: Adriana, a operadora de plano de saúde pode se negar a aceitar um cliente?
Adriana: Não, ela não pode negar. É crime de capacitismo e inclusive na própria LBI tem falando sobre essa negativa de operadora de saúde não pode acontecer, né, em relação a pessoas com deficiência.
Pati: O diretor-adjunto de Fiscalização da ANS, Marcus Braz, reforça que as operadoras de planos de saúde não podem recusar clientes, seja lá quais forem as suas condições de saúde.
Marcus: Não pode haver nenhum tratamento diferenciado para essas pessoas em relação a contratação, precificação, atendimento ou rescisão de contrato. A lei 9.656, ela traz um instituto que chama de seleção de risco, tá? É, você usar essas questões particulares da pessoa para exatamente fazer isso, você evitar uma contratação de um plano, fazer uma precificação diferenciada, não dar atendimento, né? Ou então rescindir o contrato de uma forma diferente daquelas que a ANS estipulou. Então, essa situação que ela é verdade. E aí eu posso te afirmar com tranquilidade que não, as operadoras, elas não podem se negar a aceitar nenhum cliente.
Raíssa: A Letícia teve que entrar na justiça para garantir a manutenção do plano de saúde. Ela ganhou a primeira liminar, que só foi cumprida depois de muita reclamação. O plano recorreu e ganhou o direito de cancelar o contrato. Só esqueceram de avisar a Letícia.
Letícia: Eu tive o meu plano cancelado, mas a Qualicorp, que era a empresa que meio que intermediava isso do plano de saúde, né, mandou durante seis meses o boleto do pagamento. Então eu estava pagando um plano que não existia.
Eu só fui descobrir seis meses depois quando eu fui tentar marcar uma consulta de oftalmologia. Mas eu não estava conseguindo marcar e aí eu achei que tinha um problema no aplicativo. Tentei acessar pelo site deles, no computador. E quando eu entrei no site, dizia que o plano tava inativo. Eu fiquei assim: “Como assim o plano tá inativo? Mas eu tô pagando tudo certinho. Os boletos estão chegando e eu estou pagando sem atraso. E, enfim, aí eu foi que eu comecei as ligações. Liguei para um, liguei para outro, liguei para outro. E nessas ligações, as pessoas sempre passavam para um outro número, falava que não era com eles, aquilo. Até que um deles falou: “Não, seu plano tá cancelado”. Eu falei: “Como é que é”? E aí quando eu entrei em contato com a QualiCorp, eles falaram: “Não, mas tá ativo”. E aí mandaram dizendo que estava ativo. Foi então que entrei na justiça de novo para poder falar porque o plano estava cancelado.
A QualiCorp dizia que estava ativo, então para pagar estava ativo, mas para usar estava cancelado. Bom, continuo na justiça por conta disso, agora com esse novo problema. E até agora sem desfecho algum, até agora sem uma resposta do que vai acontecer. Eu sigo sem meu plano de saúde e à espera de uma justiça que seja feita, né?
Pati: Casos como o da Letícia mostram que apesar da lei, alguns desrespeitos continuam a acontecer. E aí, o que a gente faz? Como provar que me negaram adesão porque eu tenho uma deficiência ou doença rara, Adriana?
Adriana: Se você tem o protocolo da recusa e você é uma pessoa com doença rara, e isso foi informado na hora que você estava fazendo o seu plano de saúde, isso fica, como é que eu diria, subentendido. Ela que vai ter que ir para comprovar que ela fez a recusa por outro motivo.
Raíssa: Marcus, que leis regulam essa relação dos clientes e consumidores com os planos de saúde?
Marcus: A principal legislação é 9.656 de 98, tá? Ela que criou os planos de saúde, essa parte, e aí ele tem a vedação expressa à seleção de risco, tá? Para além disso, a gente tem a suma normativa número 27 da ANS, que também traz essa afirmação. Temos o Código de Defesa do Consumidor, que também traz dispositivos que defendem, né, consumidores nesse tipo de caso, o Estatuto da Criança e do Adolescente e também o Estatuto do Idoso. Todos eles prevêem, é, um tratamento mais protegido para esses tipos de pessoas, né? E também servem para reafirmar essa negativa de seleção de risco, né? A impossibilidade de seleção de risco.
Agora em julho entrou em vigor uma resolução normativa nova da ANS chamada 623/2024. Ela trata do atendimento beneficiário, ela busca a melhoria do atendimento beneficiário pelas operadoras, tá? E uma das coisas que essa resolução traz, isso vai estar vigente a partir do ano que vem, a gente vai ter isso exposto, é um ranking daquelas operadoras que tratam bem o beneficiário, ou seja, cumprem bem as coisas e aquelas que têm mais reclamação. Vai estar exposto isso vai servir até de parâmetro para as beneficiárias saberem se a operadora tá funcionando bem, não tá funcionando. Então, a gente vai ter assim um rol ali de honra ao mérito, por assim dizer, para aquelas operadoras que estão entregando bom trabalho com base nos nossos indicativos.
Pati: E como denunciar essas situações de recusa de adesão e de atendimentos em geral relacionados aos planos?
Marcus: O que você pode fazer é entrar em contato com a ANS, tá? Levar o seu caso. É importante que você esteja munido do protocolo de atendimento, de tudo que é necessário para a gente poder fazer análise dessa situação, né? A ANS ela tem um programa, não sei se você conhece aí, isso chama-se NIP, notificação de intermediação preliminar. As reclamações beneficiárias chegam para a INS, tá? E aí o que acontece? Se for uma reclamação de natureza assistencial, traduzindo, negativa de procedimento, a operadora ela recebe esse comunicado da agência, ela vai ter 5 dias úteis para tentar resolver a situação do beneficiário. Depois ela fala com a gente. Se for outras situações, são 10 dias úteis, tá? Passado esse prazo, a ANS ela entra em contato com o beneficiário que reclamou, o consumidor, e pergunta: “Resolveu a situação”? Se resolveu a situação, maravilha, acabou o problema ali. E hoje em dia, 80% das reclamações são resolvidas nessa fase, ou seja, a cada 10 reclamações, oito a gente resolve nessa mediação. Se não resolveu, a gente vai fazer uma análise, se bem disso se faz a gente vai abrir um sancionador e eventualmente vai aplicar as sanções possíveis por lei, sendo que a mais notória é a multa.
🎵 Vinheta de transição🎵
Raíssa: Então, se o seu plano de saúde negar cobertura, suspender atendimento ou tentar cancelar o contrato sem justificativa, a gente reforça: é importante registrar a denúncia.
Pati: Você pode fazer isso diretamente no site da Agência Nacional de Saúde Suplementar, a ANS, em www.gov.br/ans, ou pelo número 0800 701 9656. Também dá pra registrar a reclamação no aplicativo ANS Consumidor, disponível de graça para celular.
Raíssa: E não esqueça: anote sempre o número de protocolo e guarde todos os documentos — laudos médicos, boletos, comunicações do plano, até print e vídeos de tentativa de acesso nos canais de comunicação. Registre tudo! Eles são a prova da sua tentativa de resolver o problema.
🎵 Vinheta de transição🎵
Pati: O VideBula é podcast original da Radioagência Nacional, um serviço público de mídia da EBC, a Empresa Brasil de Comunicação.
Raíssa: Produção e apresentação de Patrícia Serrão e Raíssa Saraiva.
Pati: A edição de Bia Arcoverde. No Rio de Janeiro, áudio e sonoplastia por Toni Godoy.
Raíssa: Já em Brasília, a operação de áudio fica a cargo de ???.
Pati: Estamos esperando sua sugestão, dúvida, elogio ou crítica no e-mail videbula@ebc.com.br. Escreve pra gente!
Raíssa: Você pode ouvir episódios anteriores e outros podcasts e séries da Radioagência Nacional no nosso site, nos tocadores de áudio e com interpretação em Libras no YouTube.
Pati: Contamos com a sua ajuda para espalhar a informação por aí: siga, curta e compartilhe o VideBula com todo mundo que precisa conhecer esses direitos.
Raíssa: Para mais informações, VideBula! Até o próximo episódio!
🎵 Vinheta de Encerramento 🎵